Notícias recentes trouxeram ao conhecimento público que desde 2015 se verificaram apenas cinco acusações pela prática do crime de violação do segredo de justiça. De acordo com o Diário de Notícias (03.04.2017, Filipa Ambrósio), entre 2015 e 2016 foram instaurados setenta e um inquéritos, sessenta e oito foram arquivados e cinco seguiram para acusação.
Não é preciso estar muito atento para perceber que diariamente o espaço mediático é preenchido por notícias sobre processos judiciais que, como também se notícia alegremente, se encontram sujeitos ao segredo de justiça. Assim, parece claro que este espetáculo mediático só é possível se, das duas uma, houver muita gente dotada de elevadas capacidades telepáticas ou andar muita gente a contar o que não deve.
Como não sou muito crente em telepatias, é forçoso admitir que existem muitos agentes com ligações aos processos judiciais que violam reiterada e grosseiramente o seu dever de guardar segredo sobre os factos que tomam conhecimento no exercício das suas funções.
É por isso que os dados publicados pelo DN e avançados pela Procuradoria Geral da República causam a maior surpresa a todos e, de resto, são notícia. Sim, porque não haver acusações não é, em si, um mau indício, antes pelo contrário, mas sim o contraste desses dados com uma realidade que os tornam portadores de muito más notícias. E é, de facto, de más notícias que estamos a falar.
O segredo de justiça não existe para maçar as pessoas ou para lhes roubar os pormenores, mais ou menos sórdidos, de determinado processo que gostamos de acompanhar à hora jantar.
A importância do segredo de justiça radica na defesa de direitos liberdades e garantias dos cidadãos que se vêem envolvidos, às vezes bem, às vezes mal, em processos judiciais. É preciso ter claro que a ninguém pode ser retirado o direito de se defender, que a ninguém pode ser retirada a garantia de que a sua inocência se presume até ao trânsito em julgado de uma decisão em sentido contrário e, bem assim, que ninguém pode ver o seu nome e honra julgados em praça pública e em antena livre com consequências e danos potencialmente devastadores e irrecuperáveis.
É preciso, também, garantir que as entidades que investigam dispõem dos meios necessários para prosseguirem uma investigação eficaz e livre de perturbações externas e internas.
A importância de defendermos o cumprimento de regras tão básicas como a do segredo de justiça radica, pois, na defesa de todo o sistema de justiça, que se quer protetor dos direitos, liberdades e garantias, célere, eficaz e que produza decisões justas e legais.
A defesa deste princípio basilar torna-se, por isso, um imperativo de cidadania e um dever solene para todos os agentes da justiça, se queremos ter um sistema de justiça credível. A pior autoridade não é a que não impõe regras, é aquela que as impõe, mas depois permite a sua violação sem qualquer resistência ou sanção.
Mesmo num país de brandos costumes, onde por graça até se diz que “um segredo é uma coisa que se conta a uma pessoa de cada vez”, o povo já diz há muito que “quem segredo não guarda, confiança não merece”.
Investigue-se, acuse-se e afaste-se, portanto, aqueles que não guardam o segredo de justiça, pois são pessoas que não merecem a nossa confiança.
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