“Acontece muitas vezes que somos estimados na proporção em que nos estimamos a nós mesmos.”
Marquês de Vauvenargues
Não pode um Estado de direito democrático ostentar um sistema de justiça forte, operante, eficaz e sadio se não houver um respeito recíproco e consistente entre todos os que nele participam.
Desta forma, não pode uma advocacia amordaçada, sobrevivente – quase “contumaz” – contribuir para aquele escopo.
Por outro lado, bons Magistrados respeitam e pugnam por uma advocacia interventiva, que não vive “processualmente alienada”, numa letargia profunda e num silêncio amedrontado que de si nada diz, mas sobretudo que não logra exercer a função de interesse público que lhe compete: a defesa intransigente dos direitos, liberdades e garantias dos sujeitos processuais.
O bom Advogado não veste apenas a Toga, antes abotoa-se de prerrogativas constitucionais, ao abrigo das quais brande a espada dos seus elevados conhecimentos técnicos, de forma minuciosa, contundente, rigorosa e exigente. E, desengane-se quem pensa que existem “minudências” processuais, pois uma Advocacia qualificada domina o processo de forma exímia e pugna pelo cumprimento do seu rito de maneira clarividente e absolutamente perfeccionista, pois quem tem o sentido de Justiça inscrito no seu código genético bem sabe que não existem pequenas ou grandes injustiças. Outrossim, o que pode existir – embora não deva – é a Injustiça!
Um Advogado que não tenha coragem e ousadia não pode envergar a toga com a independência, liberdade e idoneidade elementares que lhe são exigíveis para o adequado exercício do seu múnus. E apenas se verga ante a sua consciência e é dela – exclusivamente – tributário.
O bom Advogado ama a liberdade e da mesma é um defensor inflexível, porque há redutos onde não é possível transigir. Uma boa Magistratura convive bem com esta advocacia livre e tenaz e sempre apreciará esta advocacia que não é titubeante, que nada teme, mas que contribui com o seu labor para a evolução da ciência jurídica.
Uma advocacia queda e muda é o inverso de tudo quanto deve ser a advocacia: é um obstáculo intransponível à boa e justa composição dos interesses em confronto, razão pela qual não é respeitada, já que apunhala os seus deveres éticos, mais não sendo do que uma inconciliável contradição nos seus próprios termos, no âmbito da lide.
Mas o respeito nunca se presume, o respeito advém de uma interacção dialéctica em que é exercitado, com vigor e sem peias.
Carnelutti disse outrora que ser Advogado era exercer a mais difícil e perigosa das profissões, mas acrescentamos, também, que será indubitavelmente a mais bela e mais nobre pelo significado intrínseco que possui de desapego ao “eu” para fazer via sacra alheia, suportando o peso de tantas cruzes, que não são a sua própria.
O Advogado é, por natureza, parcial, pois é o que vai em socorro e adere à tese de um terceiro que lhe confiou os seus interesses, como a fazenda ou a própria liberdade. Ora, este ónus é profundamente inconciliável com o medo, ou até, com o simples temor reverencial. O Advogado só deve ter em mente agradar à realização dos fins de Justiça, com a argumentação – de facto e de direito – que aporta para o processo, a fim de fazer prevalecer os direitos e as garantias daquele que depositou nele esse laço, indelével, de confiança. O Advogado que, tolhido pelo receio de “incomodar” o Tribunal se abstém da prática de um determinado acto dissolve nesta hesitação toda a sua razão de ser.
A dialéctica processual expressa bem, pois, a da própria vida, em que o Magistrado também é Humano e, como tal, só respeitará quem, com elevação, educação, urbanidade e categoria técnica, impregne a marcha processual dessa mesma Humanidade, com a coragem e o “hábito da liberdade” – como lhe chamou Virginia Woolf – não abdicando de intervir processualmente por receio de “alvoroçar” o processo ou “indispor” o Tribunal e ver negada uma pretensão que merecia provimento.
Com efeito, a boa Magistratura jamais se deixará enlear em pseudo mesuras que apenas servirão como panaceia das dores de que padece quem não apreendeu a componente axiológica e técnica do seu dever de ofício e deambula, penosamente, de cervical dobrada, numa dolorosa tentativa de dobrar o cabo das suas tormentas trilhando todos os atalhos, em vez de pisar o chão firme do seu caminho.
A boa Magistratura sempre compreenderá onde radica a razão e nunca presumirá uma respeitabilidade que não foi, convicta e correctamente, exercida e demonstrada. Ao Advogado está vedada a “abstenção” de combate incessante por essa respeitabilidade, antes impõe-se-lhe que tome posições, legais, legítimas e conscientes.
Os bons Magistrados sempre respeitarão os Advogados e uma boa Advocacia fará forte a Magistratura, todos contribuindo, nesta dinâmica actuante e efectiva, para um sistema de Justiça eficiente e de excelência.
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